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As universidades e o desenvolvimento do estado do Rio de janeiro

RELATÓRIO E APRESENTAÇÃO DO DÉCIMO WEBINÁRIO ‘AS UNIVERSIDADES E O DESENVOLVIMENTO DO ESTADO DO RIO DE JANEIRO’ DE REALIZAÇÃO DA REDE PRÓ-RIO.

O 10º encontro da série “O Rio de Janeiro pós-Covid” foi o webinar “As Universidades e o desenvolvimento do estado do Rio de Janeiro”, que aconteceu em 15 de dezembro de 2021. O evento contou com a participação da reitora Denise Pires de Carvalho (UFRJ), do vice-reitor Fabio Barbosa Passos (UFF), do vice-reitor César Augusto da Ros (UFRRJ), do vice-reitor Mario Carneiro (UERJ), do reitor Raul Palácio (UENF) e da reitora Luanda Moraes (UEZO) como palestrantes. O coordenador da Rede Pró-Rio Bruno Sobral (FCE/UERJ) realizou a moderação do evento e a Prof. Renata Lèbre la Rovere (IE-UFRJ) auxiliou na organização do evento.

Reitora denise pires de carvalho

A magnífica reitora inicia sua palestra afirmando que nenhum país jamais alcançou a condição de desenvolvido sem investimentos estratégicos nas universidades públicas, porém tal esforço não é suficiente para o desenvolvimento, pois a ausência de estratégias para retenção da mão de obra qualificada no território nacional mina os resultados dessas instituições devido à perda de capital humano, fenômeno conhecido como “fuga de cérebros”. No contexto brasileiro, tal fenômeno é exemplificado pela reitora por meio da apresentação das estatísticas de imigração para os Estados Unidos de trabalhadores com formação em ensino superior realizada no Brasil.

Em seguida, é demonstrado que o quadro de concentração das instituições responsáveis pela graduação no Brasil, localizadas principalmente no estado de São Paulo e no extinto estado da Guanabara, foi em parte revertido ao longo da segunda metade do século XX, com intensificação do processo após 2002, no qual os Institutos Federais tiveram participação importante. Concomitantemente, a dependência do sistema de ensino nacional para com as instituições estrangeiras no que tange aos cursos de pós-graduação foi muito reduzida, graças ao processo de verticalização do ensino superior público no país. Ainda que tenha ocorrido aumento expressivo no número de discentes e docentes presentes no ensino superior após 2002, tanto na esfera pública quanto na privada, tal progresso não é suficiente em termos de inclusão, pois 75% da população entre 18 e 24 anos não ingressa no ensino superior, e dos 25% que o fazem incide grande taxa de evasão. Por outro lado, a contribuição das universidades para o desenvolvimento ainda é deficiente, pois variáveis relevantes para o desenvolvimento do sistema de ciência e tecnologia, como o estoque de profissionais com doutorado, estão abaixo do nível necessário para atender as necessidades do país.

A reitora então relembra a deterioração da condição do ensino superior no país, majoritariamente devido à ausência de financiamento adequado em função dos cortes orçamentários ao qual as universidades tem sido submetidas desde o pico dos repasses em 2015. Dentre as consequências observadas ou esperadas dessa deterioração é o prejuízo causado ao sistema de ciência e tecnologia e a queda do número de profissionais com doutorado. É reiterado que, dentre os profissionais com essa qualificação, a maioria está empregada em cargos relacionados à educação, condição que em si não é danosa ao país, porém demonstra o longo caminho a ser percorrido até a sua graduação como país desenvolvido, no qual a maior parte desses profissionais trabalha em indústrias de alta tecnologia.

Dando continuidade à sua palestra, Denise apresenta os resultados mais notáveis gerados pelos programas de extensão da universidade, que foram efetuados em aceitação ao tripé educacional imposto pela constituição. Tais programas, tal como o Parque Tecnológico, desenvolvem tecnologias em parceria com outras instituições com o objetivo fundamental de contribuir para com a sociedade à medida que impulsionam o desenvolvimento do estado.

Por fim, a reitora defende uma proposta de atuação em várias frentes para estancamento do problema da “fuga de cérebros” apresentado anteriormente, que perpassa a recomposição do financiamento das universidades, a melhoria das carreiras dos profissionais com ensino superior, a desburocratização e a maior interação universidade-empresa.

vice-reitor fabio pereira passos

O magnífico vice-reitor da UFF dá início a sua exposição denunciando a queda brusca do orçamento das universidades a partir de 2016, em função da queda dos repasses federais no contexto da lei do “Teto dos Gastos” aprovada sob forma da Emenda Constitucional n.º 95, como responsável pela interrupção do processo de revitalização que ocorria nas universidades. Ainda que a importância das universidades para o bem estar social seja indiscutível, a contribuição desses entes nem sempre se manifesta de forma visível, logo o palestrante aponta que a manutenção de canais de debate com a sociedade cumpre papel em legitimar o aporte de recursos, necessários para que tais instituições possam realizar investimentos e honrar suas despesas de manutenção, e tal objetivo é alcançável por meio da visibilidade do produto criado em seu interior pela opinião pública. Nesse contexto de estrangulamento financeiro, a UFF adotou a racionalização de suas despesas de acordo com os princípios de boa gestão sugeridos pela ciência, de forma que as despesas da instituição se adequaram ao seu orçamento por meio do uso eficiente do dinheiro, porém esse processo não ocorreu sem prejuízos para a qualidade de seu produto. O vice-reitor sintetiza sua argumentação defendendo que a instituição que representa está apta a receber mais recursos do poder público, que seriam utilizados para ampliação de suas atividades, visto que a alta eficiência de sua operação a qualifica a receber mais verbas.

Enquanto o socorro federal não se concretiza, Fabio aponta os esforços de colaboração com os munícipios como os principais veículos de inserção das competências institucionais para gozo coletivo. O palestrante cita projetos com os munícipios de Niterói e Maricá para resolução de problemas urbanos e promoção do conhecimento científico para uso técnico pelos moradores desses locais, de forma a promover o desenvolvimento econômico do estado do Rio de Janeiro.

Em relação ao desafio imposto pela pandemia do Coronavírus sobre o estado, afirma que a UFF teve postura engajada e combativa para amparo aos mais afetados, citando a atuação dos hospitais universitários em atender a população e dos segmentos de pesquisa e desenvolvimento de produto em conceber e fabricar máscaras e respiradores. Para evitar o aumento da evasão do corpo discente em função da impossibilidade em dar continuidade à carreira em meio a deterioração da condições socioeconômica e de biossegurança, a UFF impulsionou programas de apoio digital voltados para alunos em condição de vulnerabilidade social.

Em relação às demais instituições que colaboram com a universidade para formação do ambiente de inovação do estado, o vice-reitor elogia fortemente a FAPERJ por seu papel exemplar como órgão de fomento para pesquisa, e identifica a ausência de agentes que façam as funções intermediárias do processo inovativo como um dos principais fatores que impedem que o estado alcance seu potencial inovativo. 

vice-reitor césar augusto da ros

O magnífico vice-reitor expõe a história da instituição que representa, que se inicia com a fundação em 1910, sendo portanto uma das universidades mais antigas no país, e cujo núcleo de competências inicial se concentrava nas áreas de agronomia e veterinária, o qual motivava forte ligação ao Ministério da Agricultura. Desde sua fundação, a universidade realiza atividades de pesquisa, que eram majoritariamente voltadas ao avanço técnico da economia rural, e cabe ressaltar que uma das características mais visíveis da instituição era seu perfil nacional, uma vez que estudantes de todas as regiões do país tinham peso sobre a formação do corpo discente. O vice-reitor então aponta o programa REUNI, que consiste na iniciativa de ampliação do ensino superior para aumentar o acesso às universidades, como principal responsável pela transformação do perfil da universidade que ocorreu nas últimas décadas, pois a instituição foi contemplada com grande expansão, em parte realizada por meio da diversificação das áreas de atuação além do núcleo original e por meio da verticalização do ensino, que causou o aumento da inserção da universidade na Baixada Fluminense e, portanto, tornou acessível pela primeira vez o ensino público para parte marginalizada da população.

Em relação aos avanços realizados atualmente pela UFRRJ, o vice-reitor defende que a universidade está totalmente engajada com os projetos de extensão, e os primeiros passos na direção da formação de parcerias universidade-munícipios estão sendo realizados. Ainda assim, a situação atual não dá margens para otimismo, pois o ensino superior brasileiro é fortemente dependente de recursos públicos para manutenção das operações, logo a queda de financiamento ocorrido no contexto da aprovação da Proposta de Emenda Constitucional 95 foi muito prejudicial à todas as universidades públicas.

O vice-reitor também aponta o mau desempenho do sistema macroeconômico brasileiro como responsável por minar o impacto das universidades para o desenvolvimento, pois defende que a principal contribuição das universidades para com a sociedade se dá através da atuação de seus egressos nos setores de atividade produtiva, porém a inserção desses profissionais se encontra muito dificultada pela péssima condição do mercado de trabalho, que sofre com a perpetuação de taxas de crescimento pequenas. O alto desemprego é fator estimulante para a “fuga de cérebros”, logo a acumulação de estoque de capital humano depende de políticas mais amplas para retenção desses egressos.

Por último, César indica como áreas prioritárias para superação da crise do ensino superior público no estado a recuperação dos orçamentos dessas instituições, o fortalecimento das políticas de assistência para redução da evasão estudantil, que são ainda mais necessárias para democratizar o acesso ao ensino superior nesse contexto de regressão socioeconômica, e o fortalecimento e continuidade da ação da FAPERJ, cuja atuação tem sido essencial para a pesquisa, imprescindível para inovação e avanço do ensino, no estado.

vice-reitor mario carneiro

O magnífico vice-reitor Mario Carneiro participa do evento em substituição ao Reitor Ricardo Lodi, que infelizmente não pode participar em função de problemas de saúde. Ao apresentar o retrospecto recente da UERJ, Mario afirma que a grande crise financeira da universidade, consequência da crise fiscal do estado, já foi quase totalmente superada, porém a instituição sofre da precarização do ensino superior da mesma forma que suas parceiras regionais. Para fazer frente aos desafios levantados pela pandemia do Coronavírus, a UERJ cresceu e contribuiu ativamente em políticas públicas para o estado, ao passo que os hospitais universitários se adaptaram para hospitalização dos infectados e testagem do vírus. Como consequência dessa mobilização, a instituição acumulou conhecimento através de aprendizado, e está ansiosa para aplicar essas novas competências para auxiliar o estado em seus novos desafios para o desenvolvimento.

A piora da condição socioeconômica durante a pandemia aplicou mais pressão sobre as políticas estudantis, que tiveram que ser ampliados para impedir o aumento da evasão estudantil. Se destacam nesse processo a criação da pró-reitoria de saúde, visto que 1/3 da atividade da UERJ é relacionada à área, e a distribuição de 8000 tablets para superação da barreira da exclusão digital.

Segundo Mario, o foco da universidade para o futuro próximo se concentra em aumentar as atividades de extensão, pois a interação universidade-empresa é muito importante para o desenvolvimento do estado. Por outro lado, o financiamento público para pesquisa também deve ser ampliado, visto que a iniciativa privada se restringe a investir em projetos com horizonte de retorno menor, logo se recusa a viabilizar investimentos de longo prazo e de maior incerteza necessários para o progresso inovativo, e também porque a atuação recente da FAPERJ demonstra a importância dos gastos em pesquisa para o estado. Por último, o vice-reitor relembra que a defesa da universidade pública, sobretudo em relação a sua autonomia, é uma tarefa que necessita de atenção constante. 

reitor raul palácios

Segundo o magnífico reitor Raul, tendo em vista que qualquer tentativa de desenvolvimento do estado requer o debate acerca de qual tipo de sociedade é desejada, o modelo de desenvolvimento defendido pela UENF é um que satisfaça os requisitos da inclusão e do benefício coletivo.

O reitor menciona a discussão acerca do uso dos fundos soberanos como ferramenta de financiamento das universidades e elogia a capacidade desses mecanismo em financiar as operações do ente público e prover autonomia financeira em relação aos repasses federais e estaduais. A autonomia universitária está prevista na constituição, porém deve ser consolidada a partir do fortalecimento jurídico e financeiro dessas instituições, e tal missão deve ser exercida de forma muito energética no ano de 2022.

Em relação à atuação da UENF, o reitor alega que o desenvolvimento sustentável é um tópico que tem muita adesão na instituição, e que pode receber grande impulso se mais atenção for dada à aplicação do conhecimento armazenado em forma de patentes que nesse momento está subutilizado. Isso se deve à percepção que a sociedade civil tem grande interesse na utilização desse conhecimento em produtos que aumentem o bem estar social, porém, infelizmente, parte considerável desse material se encontra engavetado a espera de agentes que tenham capacidade de converte-los em bens tangíveis e intangíveis. Além da utilização da pesquisa básica e aplicada como instrumentos de promoção do avanço tecnológico e do desenvolvimento do estado, também cabe à universidade agir em contato direto com a sociedade para saciar as necessidades da população.

Por fim, o reitor argumenta que o negacionismo presente em alguns segmentos do governo não foi assimilado pela população, que mantem postura pró-ciência e reconhece o papel da universidade como promotora de bem estar, cabendo as mesmas realizar esforços colaborativos para consolidar o apoio da opinião pública, e critica o otimismo em relação à capacidade do Regime de Recuperação Fiscal em superar a crise estadual via planos de austeridade, pois a recuperação tem como condição necessária o aumento dos gastos públicos com o objetivo de alcançar o desenvolvimento.    

reitora luanda moraes

A magnífica reitora defende que as universidades são, acima de tudo, patrimônio do povo e do estado, e que atualmente contribuem para a inserção no espaço social de parcelas da população excluídas devido à heranças colonialistas e escravocratas. A importância estratégica das universidades também deve ser enfatizada, pois a pesquisa realizada no interior das mesmas é importante para redução da dependência em relação à tecnologia estrangeira. Em relação à atuação da universidade no meio em que está localizada, a reitora argumenta que a UEZO tem muito orgulho em sua capacidade de melhorar o IDH da região, visto que a está localizada no município de Campo Grande e atende a uma área que apresenta um dos IDH mais baixos do estado do Rio de Janeiro. O principal instrumento utilizado pela instituição para contribuir para com a população local é a qualificação da mão de obra para o mercado de trabalho, pois disponibiliza cursos de mestrado em materiais e de mestrado ambiental que interagem muito bem com as indústrias locais. Ainda assim, a reitora reconhece que esse modelo de atuação é insuficiente, pois conforme apenas pessoas com inserção nessas indústrias conseguem usufruir dessas linhas acadêmicas, é necessário ampliar as áreas de atuação para que parcela maior da população local seja contemplada.

A reitora Luanda exibe preocupação em relação à trajetória de cortes orçamentários das universidades, pois a insuficiência de recursos prejudica a todo o ensino superior público, porém afeta com mais intensidades as universidades mais recentes e menos consolidadas. Conforme a UEZO tem apenas 16 anos e não configura universidade, pois lacunas básicas na infraestrutura institucional a limita a posição de centro universitário, certamente faz parte do grupo de instituições de ensino superior mais sensíveis, e, segundo a reitora, parte dessa vulnerabilidade é explicada pelo fato da UEZO ser uma universidade precária desde sua fundação.

A reitora Luanda admite que o tripé ensino, pesquisa e extensão não pode ser realizado em sua plenitude em função de deficiências orçamentárias e administrativas, mas declara que tal princípio constitucional foi adotado pela UEZO. Por último, ao se referir ao projeto de união UERJ/UEZO que tramita na ALERJ, alega que terá papel fundamental em definir o futuro da universidade e que, caso aprovado, será muito benéfico para a entidade que representa.

Em seguida, o moderador Bruno Sobral agradece a presença dos participantes e explica que o deputado Waldeck Carneiro, atual presidente da comissão de ciência e tecnologia da ALERJ e participante confirmado para o evento, não pode estar presente devido à demanda de seu mandato político, porém comunica o apoio do mesmo ao evento. Em seguida Bruno defende que a conscientização acerca da importância em defender as universidades públicas é a razão de ser da Rede Pró-Rio, e que a melhor forma de alcançar esse objetivo é demonstrar seu papel estratégico para o estado.

A Professora Renata Lèbre La Rovere adiciona que eventos de webinar, tal como os realizados pela Rede Pró-Rio, são exemplos de como as universidades podem entrar em contato entre si para apoiar o poder público.

O moderador Bruno então convida os participantes a fazerem suas considerações finais antes do encerramento do evento.

considerações finais

É consenso entre os reitores e vice-reitores que a colaboração entre as universidades é importante para atender as necessidades da população e que o retorno ao sistema de ensino presencial será benéfico para a qualidade das atividades, porém os riscos causados pela pandemia devem ser respeitados. O vice-reitor Mario Carneiro (UERJ) aproveita o momento para defender que a união entre a UEZO e a organização que representa será benéfica para as duas partes, pois o intercâmbio de competências causado pelo processo será construtivo do ponto de vista institucional.

Autor: Caio José das Chagas Monteiro  Aluno de Iniciação Científica do Instituto de Economia da Universidade Federal do Rio de Janeiro (IE/UFRJ)

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