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Economia criativa e política cultural

RELATÓRIO E APRESENTAÇÕES DO quarto WEBINÁRIO ‘Economia Criativa e Política Cultural’ DA SÉRIE ‘O RIO DE JANEIRO PÓS-COVID’ DE REALIZAÇÃO DA REDE PRÓ-RIO.

O 4º encontro da série ‘O Rio de Janeiro pós-Covid’ foi o webinar ‘Economia Criativa e Política Cultural’, que aconteceu em 30 de junho de 2021 e contou com a participação da Professora Lia Calebre (UFF), da Professora Luciana Guilherme (ESPM) e da Julia Zardo (Firjan) como palestrantes, e da Professora Renata Lèbre (UFRJ) e Prof. Adair Rocha (UERJ) como mediadores.

profa. lia calabre

A Profa. Lia Calabre inicia sua fala trazendo a instabilidade entre tempos de ausência e de existência de políticas culturais no Brasil. Onde períodos de construção de políticas são intercalados com períodos de ausência e omissão do Estado. A partir dos anos 2000, no entanto, essas políticas passam a se dar de forma mais numerosa, tanto a nível federal quanto estadual.

Um primeiro problema que Lia traz se refere à institucionalidade e a introjeção da cultura no campo das políticas públicas. O que vem sendo observado universalmente é cada vez mais a institucionalização e a maior inserção da cultura em discussões das áreas econômica e social. Entretanto, temos, no Brasil, uma dificuldade de fazer as leis efetivas. Além do país estar vivenciando um período de grandes incertezas em relação ao futuro, há também a ameaça às áreas de política, educação e ciência. As políticas vêm sendo pensada de formas episódicas, e em eventos pontuais. Além disso, há uma grande dificuldade de avaliação em termos de eficácia, eficiência e efetividade das políticas culturais nos moldes tradicionais. Nesse sentido, há uma multiplicidade de desdobramentos das políticas de cultura, os quais não são igualmente mensuráveis, além de levarem tempo para gerar resultados.

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A professora argumenta que um dos caminhos que vem sendo trilhado na direção da constituição de uma institucionalidade mínima é o pensamento da política de forma participativa, de forma a chamar diversos agentes sociais, com a participação de gestores públicos, agentes culturais locais, agentes da sociedade e fóruns de artistas. O resultado que pode ser observado, e mostra que esse exercício vem sendo produtivo, foi o processo de construção da lei Aldir Blanc, a qual só teve o atual grau de acerto e efetividade por conta desse conjunto de agentes, fóruns e redes que foram construídos ao longo do processo participativo. Dessa forma, foi viável uma grande articulação e troca de saberes entre os diferentes participantes.

Em seguida, é trazida a rica diversidade existente no Estado e metrópole do Rio, a qual precisa ser mapeada e reconhecida. A cidade tem um grande potencial de geração de emprego e renda por meio dessa diversidade. Ou seja, para muito além dos grandes negócios e dos grandes eventos. Como exemplo, Lia traz a cadeia criativa do Carnaval, que envolve um grupo muito amplo de profissionais especializados. É necessário, portanto, mapear essas informações dispersas desses setores, e focar no financiamento e na formação dos agentes envolvidos nessa produção criativa diversa. A palestrante ressalta que a potencialidade da área da cultura se revela de forma cada vez mais evidente. À medida que adentra as cadeias de produção, que são muito complexas e alimentam uma economia com grande capacidade geradora de emprego e renda. Entretanto, essa riqueza existente no Rio de Janeiro é pouco explorada.

profa. luciana guilherme

Luciana inicialmente traz a complexidade inerente à economia criativa, por conta das dimensões simbólica, cidadã e econômica que esta abarca. Esta é uma economia onde a grande parte dos profissionais estão em micro e pequenas empresas, por todo Brasil. E estão envolvidos em diversas atividades, as quais também mobilizam setores tradicionais. A economia criativa é, portanto, um processo que tem de ser pensado em sua dimensão econômica. Mas sem deixar de lado suas dimensões ambiental, cultural e política.

Ao pensar na formulação de política pública, Luciana chama atenção de que esta acontece no território. É necessário olhar para o território, as pessoas e as instituições que estão ali presentes. Há um sistema de relações no território que devem atuar juntas na construção da política pública. No entanto, muitas vezes as políticas não são apropriadas pela sociedade civil e pelas redes de instituições presentes no território, sendo raro ver ações estruturantes e transformadoras. Nesse sentido, as institucionalidades seriam uma possibilidade de desenvolvimento. É necessário pensar, ao formular as políticas públicas, também na geração de dados e indicadores, na formação para competências que promovam a criatividade e inovação em rede, que promova fomento técnico e financeiro, e na formação e adequação de marcos legais.

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Em seguida, Luciana traz resultados de uma pesquisa que participou com o objetivo de entender de que forma a Covid-19 impactou o campo da economia criativa. Os principais temas investigados foram os impactos estimados da pandemia, as estratégias e necessidades para o enfrentamento, e entendimento das relações prévias com os mecanismos de financiamento à cultura. Luciana apresenta os resultados, e chama atenção para as altas cargas de trabalho, o fato da maioria não possuir um vínculo empregatício formal, e as poucas reservas financeiras existentes no início da pandemia.

Em termos do impacto, a maioria foi muito impactada pela suspensão de atividades e tiveram de reduzir contratos e/ou demitir trabalhadores. Além disso, houve um agravamento da imprevisibilidade do setor. Também foi observado que a maior necessidade observada para lidar com a situação imposta pela pandemia foi o domínio de estratégias digitais de relacionamento com o público, quando a crise obrigou uma apropriação desses conhecimentos de forma rápida.

Em seguida, Luciana traz as principais medidas para recuperação econômica do setor, citando linhas de crédito, perdão de dívidas, desoneração tributária e bolsas no âmbito da sustentabilidade financeira. No âmbito do fortalecimento da gestão cultural, há a ampliação e profissionalização de órgãos de cultura, as campanhas de valorização das artes, canais de comunicação e pesquisas de mercado. No eixo de aprimoramento da atuação profissional em ambiente digital, ressalta-se o domínio de estratégias de monetização das atividades online, o suporte para digitalização de acervos e aquisição de equipamentos.

Por fim, a Profa. Luciana menciona a Lei Aldir Blanc, a qual traz um auxílio emergencial, fundamental para dar minimamente um apoio ao setor. No entanto, muitos municípios não conseguiram acessar recursos por conta de uma existente fragilidade dos órgãos de cultura.

julia zardo

Julia inicia sua fala trazendo o atual contexto da Nova Economia, de constante transformação, e no qual há uma interseção cada vez maior de diferentes setores econômicos. Características observadas nessa economia são de novos comportamentos, novas tecnologias, novos valores e novas formas de consumo, aos quais as empresas têm de se adaptar para se manter. Mudanças no mercado de trabalho e nos negócios também são nítidas. Assim, exigindo novas competências para profissões do futuro, novos modelos de negócios e novas configurações das empresas.

Em seguida, Julia traz uma provocação do como e o porquê de se ter a Economia Criativa como Fator de Desenvolvimento. Para responder a essas questões, a convidada traz uma fala de Gilberto Gil na qual se faz menção da cultura também como fator econômico gerador de riquezas, assim como de espaço e de inclusão social. Ao apresentar a pesquisa realizada bianualmente pela Firjan, Julia traz o mapeamento da indústria criativa, com as óticas do mercado de trabalho e da produção no Brasil e nos estados. De acordo com os dados, a indústria já vinha num contexto de crise econômica, com redução do número de estabelecimentos e de empregados. O Rio de Janeiro, particularmente, por conta do encadeamento de crises econômica, política, fiscal, social e de autoestima da população, ainda seguia em crise antes da pandemia.

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Para trazer as mudanças que vêm ocorrendo nesse mundo da indústria criativa, Julia traz o impacto da digitalização, que oferece novas tecnologias mais acessíveis, e leva a uma diminuição de barreiras tanto de produção quanto distribuição de produtos. Além disso, há uma mudança na lógica de concorrência, e uma perda de força das mídias tradicionais, as quais vinham perdendo confiança antes da pandemia. Com um recorte da pesquisa que inclui uma maior gama de profissionais considerados criativos, houve novos profissionais envolvidos. Esses estão presentes principalmente no setor de serviços, com uma parte considerável ocupando a Indústria de Transformação. Apesar de ser possível observar que desde 2017 o setor já sofria uma crise, pelos dados apresentados, fica possível notar um número relevante de criação de postos de trabalho ligados ao consumidor, à digitalização e a diferenciação de produtos/ serviços.

Na busca de responder a questão de como ter a Economia Criativa como fator de desenvolvimento, Julia ressalta a importância de se conhecer o setor. Além do esforço em formar empreendedores e empreendimentos, e criar ambientes de inovação. No Rio, a pauta de Economia Criativa possui tanto uma pauta prioritária atual, quanto uma de futuro. A pauta atual conta com a importância da infraestrutura, de um Estado eficaz e eficiente, da desburocratização e do fomento. Já para as pautas futuras, Julia traz a relevância de enxergar a importância das capacitações, de parcerias público-privadas, da inovação e da regionalização.

Rodada de perguntas

Adair rocha

O Professor Adair Rocha inaugurou a rodada de perguntas e questionou a respeito do pressuposto conceito de cultura, o que o mercado considera como cultura, e o que é, de fato, a cultura. Adair também menciona a questão dos eventos, que estão ligados à noção de espetáculo, e das festas, que estão ligadas às expressões populares. Nesse sentido, Adair traz o fato de que, segundo uma ótica do mercado, quando se fala de favelas é como falar de uma cultura da invisibilidade, que esconde o que é a significação de fato. Adair, portanto, traz a importância de questionar expressões que são naturalmente usadas. Além disso, o Professor traz a relevância desse diálogo frente a uma onda de negacionismo.

Lia Calabre

Lia inicia a resposta pontuando a importância da política cultural para construção de novos imaginários. Além disso, traz a necessidade de novas vocações que precisam ser trabalhadas, simultaneamente ao fortalecimento das matrizes culturais originárias. O conjunto de gestores públicos precisa apreender e exercitar essa complexidade do conceito de cultura. E, os investimentos precisam se dar em todas as arestas.

Luciana guilherme

Luciana busca mostrar que o cerne da questão está na compreensão do território, onde todos os setores se mostram presentes e se relacionam. Além disso, ao falar do Estado do Rio de Janeiro, ela busca trazer a grande diversidade existente. Essa diversidade não pode ser homogeneizada em um só território. Além disso, ela traz a importância de pensar além da indústria tradicional, e pensar em uma nova, na qual há uma liberdade de escolha que é a base da criatividade, a qual, por sua, vez é base da cultura. Tudo isso, no final das contas, traz resultados econômicos. No entanto, é importante que haja investimentos e o reconhecimento da potência dessa indústria.

Julia Zardo

Julia, por sua vez, retoma a necessidade das novas formações. Nesse sentido, ela menciona o papel do jovem, que possui muito potencial para agregar através de suas competências relacionadas ao mundo digital. Muitas iniciativas vêm nesse sentido, buscando a inclusão desses jovens no mercado. Por fim, ela menciona a falta de confiança existente, quando não há o encontro dos diferentes indivíduos para conversar.

Autora: Yasmin Ventura Araújo Aluna de Iniciação Científica do Instituto de Economia da Universidade Federal do Rio de Janeiro (IE/UFRJ)

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